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Corpos à Deriva

Desde que iniciei este blog ainda não tinha escrito acerca do cinema português e isso deve-se, basicamente, ao facto do cinema feito em Portugal ser sobretudo uma ideia intelectual que procura apenas interessar os próprios realizadores dos filmes como objectos hermeticamente fechados (como é o caso do cinema de Oliveira) ou cinema comercial sem chama (Crime do Padre Amaro ou os ultimos filmes de Joaquim Leitão).
Existe, no entanto, a excepção à regra como demonstra o mais recente filme de Fernando Lopes, de seu nome "98 Octanas". Gostaria muito de vos poder fazer um resumo da historia, no entanto, não se trata de uma narrativa no sentido convencional do termo, é antes da ordem da poesia, do encandeamento, do não dito, da contemplação e do diálogo.
Temos 2 personagens, Dinis (Rogério Samora) e Maria (Carla Chambel) que se encontram numa estação de serviço e partem à deriva, ou melhor, em busca de um rumo para cada um. Não existe explicação, não sabemos se eles se conhecem, mas descobrimos que são pessoas que procuram alguma coisa: ele a morte/redenção e ela o sonho/retorno à infância.
Trata-se de uma viagem dos sentidos, num ambiente esteticamente perfeito, com o olhar nos 2 seres à deriva, procurando um rumo no caos da vida actual e com tempo para contemplar o outro. Em minha opinião, o filme tem 2 cenas chave, uma passada num hotel de beira de estrada em que ela o confronta com os seus pesadelos e lhe mostra a possibilidade de morrer e a segunda num rio/lagoa onde ele se redime baptizando-a (um eco religioso, com o pecador a expiar os pecados?) e tomando-a nos seus braços, tendo como pano de fundo a belissima musica de Bernardo Sassetti.
A realização de Fernando Lopes é sublime quando opta pelo campo/contracampo, pelo grande plano ou em sequências nocturnas. Actualmente os espectadores de cinema não estão habituados a "olhar", a "sentir", a "ouvir" ou a integrar a paisagem no clima do filme (exemplo disto é a cena na praia com as ondas/discussão e a do pôr do sol/pecados mortais).
Num filme onde 2 actores dão tanto de si, não posso deixar de os referir, Rogério Samora como um ser amargurado e sem rumo, deixando contudo o protagonismo para Carla Chambel como a Mulher que lhe instilará a Vida e o fará percorrer o caminho dos sonhos, rumo à casa da avó (Marcia Breia).
Em minha opinião, o grande destaque do filme vai para Carla Chambel, porque o filme tem energia graças a ela, pulsa de juventude, tem força e coragem de arriscar (aquele gesto da mão a puxar as calças para se ver o tom da roupa interior foi intecional ou n? joga com a dicotomia entre inocência e preversidade). Maria é uma mulher que procura viver sem ter um destino fixo, apenas com o sonho de regressar ao local onde foi feliz e toda essa emoção nos é transmitida pela actriz.
O facto do filme não apresentar um final conclusivo torna-o ainda mais interessante porque os sonhos/poemas não têm de ser directos, são antes de mais percursos para descobrir, onde cada um encontra o seu caminho... dai a sequencia da árvore e do diálogo que se ouve no trailer, o facto do longe contradizer o perto, em minha opinião, tem origem no sonho e no rumo que cada um de nós considerar que o casal tomou a partir daquele momento. Fazendo a minha parte, penso que eles continuam em viagem até ao momento em que encontrem um espaço a que possam chamar o seu Mundo.
Se gostam de arriscar não percam este filme e sabem o que seria mesmo um sonho para mim? Ter no mesmo filme os actores Carla Chambel, Ana Moreira, Nuno Lopes e na realização a Teresa Villaverde... isso é q era!!! Mas enquanto o sonho não se realiza estou a preparar-me para assistir ao mais recente filme desta realizadora, de seu nome "Transe" e que estreia em breve.
Carpe Diem.