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Pérolas do Indie - Day Night Day Night


O Indie Lisboa ano após ano permite-me descobrir filmes que, muito dificilmente, teriam estreia nacional, com narrativas menos comerciais ou, inclusivamente, menos imediatas.

Tal como acontece com este filme que faz parte da Competição do Indie este ano, de seu nome "Day Night Day Night" e realizado por Julia Loktev (repete Segunda dia 23 às 16:15 na Sala 1 do S. Jorge).

Durante o filme acompanhamos uma jovem mulher da qual nunca sabemos o nome ou a proveniência (Luisa Williams) e que pretende tornar-se numa bombista suicida em Times Square/NYC. Para isso, alia-se a um grupo extremista do qual também desconhecemos o nome que a prepara para o momento final.

Não se trata de um filme com uma história linear, nem vimos a descobrir de onde vem esta mulher ou porque decidiu ser uma bombista suicida, resta-nos portanto ver o que ela faz para se preparar ainda que, em privado, atraves do dialogo com Deus exprima as suas duvidas no que respeita a sua missão.

A ideia de desconhecimento é que torna todo o filme aliciante pois ficamos, literalmente, agarrados a todo o procedimento de preparação que vai desde o vestuário até ao video de despedida, sempre com a preocupação dos objectos, ângulos de câmara ou mesmo do estilo de cabelo. A própria personagem principal é obsessiva com a limpeza (a si propria ou a sua roupa) e subserviente aos organizadores do atentado como se, reagindo desta forma, se redimisse de algo.

Os momentos finais passam-se em Times Square, onde acompanhamos o deambular da personagem com uma mochila às costas carregada de explosivos e completamente anónima, num reavivar das neuroses americanas através de forma realista e credivel. Ainda assim é possivel surpreender como quando a personagem que não sabemos de onde vem e que diz aos terroristas ter os pais mortos decide ligar para estes num momento de desespero (ainda que não fale e se faça anunciar por "it´s me").

A bombista é interpretada por uma espantosa Luisa Williams (trabalhava como babysitter quando respondeu às audições para o filme) que, através dos seus grandes olhos azuis evidencia quer um olhar forte e ousado como perdido e vazio... é uma mulher frágil que se torna forte porque se escuda na religião, mas que questiona se vale a pena matar-se caso ninguém esteja a ver. A força da interpretação, do olhar, da compulsividade na higiene, do sangue frio perante os enervantes momentos de espera, a confiança na organização que a faz usar vendas e algemas, o desespero quando nem tudo bate certo, faz com que nos sintamos ligados aquela mulher apesar da contradição desta ser uma terrorista.

A realização de Julia Loktiev (artista plastica) é precisa e atenta aos detalhes, sem procurar chocar e tornando humana a terrorista, como que dizendo tratar-se de uma pessoa como nós, o que por vezes temos tendencia a esquecer. Os planos audaciosos sobre o rosto da protagonista (um olhar aqui diz mesmo mais que mil palavras) ou nas mãos/gestos das pessoas que irão atravessar a rua correspondente ao atentado, criam tensão no espectador e é ai que procuramos respostas para não dito.

Um filme sem esperança mas com humanidade dentro, a mostrar que um terrorista também tem duvidas e não precisa de uma razão politica (pode ser meramente pessoal) para agir... tal como no final, a personagem interroga Deus com a frase "porque não me quiseste?", é pena que um filme assim não tenha quem o queira e arrisque uma estreia comercial.

Carpe Diem.

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