Sentidos da Fé
Maria Madalena
Há um ano a passagem deste filme pelo Festival de Cannes atribui-lhe o Grande Prémio do Júri e um novo fôlego à carreira de Abel Ferrara. Trata-se do regresso de um grande realizador experimental, como poucos no cinema americano. Após uma obra prima ("Funeral") e 2 filmes menos bem recebidos pelo público e critica ("New Rose Hotel" e "R Xmas"), traz-nos de novo a força do seu cinema e um tema que esteve por detrás, na minha opinião, da sua grande obra prima que é o filme "Policia Sem Lei": a religião.
Neste filme cruzam-se 3 histórias: a realização de um filme sobre Jesus no ponto de vista dos Evangelhos de Maria Madalena, a busca da fé da actriz do filme (uma serena Juliette Binoche) e a perda/redenção de um apresentador de "talk shows" americano (um estupendo Forest Whitaker) que se encontra a debater o Jesus histórico.
O filme dentro do filme ("Isto é o Meu Sangue" realizado por Tony Childress/Matthew Modine) procura debater a ideia da controvérsia religiosa de Maria Madalena ter sido a 13ª apóstola, e mesmo a mais importante, gerando conflitos com Pedro. A ideia de uma Mulher como igual junto de Jesus, modifica todo o ensinamento e o dogma da Igreja, dado que as mulheres sempre ficaram associadas ao Pecado Original... juntando a isto Jesus teria aparecido primeiro a Maria Madalena dizendo que a fé estava no intelecto.
Toda a história paralela do filme "Isto é o Meu Sangue" debate a ideia de intolerância religiosa, através da proibição e censura da igreja em filmes/livros, sem se preocupar em ver/ler o seu conteudo (como aconteceu com o filme religioso de Scorcese), bem como a ideia de um realizador omnipotente e ateu (apenas ele pode fazer o papel de Jesus) e que, apesar de não acreditar no que filma, acredita na arte e na polémica (um auto retrato de Ferrara?).
Na segunda história desvendamos a descoberta da espiritualidade pela actriz (Marie Palesi) que representa Maria Madalena no "filme dentro do filme" ao não conseguir abandonar a sua personagem. Marie acaba por não regressar aos EUA, viajando para Jerusálem em busca da sua paz interior e do seu bem estar espiritual sendo, inclusivamente, o "anjo" redentor do terceiro vertice do filme.
Por fim, seguimos a história de Ted Younger um apresentador de talk show que apresenta uma serie de programas, onde personalidades de diferentes religiões dissertam sobre o Jesus histórico e as diferentes formas de interpretar a fé. Em paralelo, seguimos a sua vida pessoal com a infidelidade e o afastamento gradual da sua familia até ao ponto em que algo corre mal e terá de recuperar a sua fé. Nesta parte do filme encontramos planos estupendos sobre Nova York, não são momentos de esplendor nem de dor mas sim de reflexão... uma cidade sem alma tal como o interprete, um Mundo feito de altura sem que com isso se atinja a plenitude.
Um dos melhores momentos do filme acontece numa conversa telefonica em que Ted pergunta a Marie o que deve fazer para que seja perdoado e ela responde-lhe que deveria falar com Deus... a resposta dele é de que não sabe como fazer isso. Neste excerto reside toda a mensagem do filme, a Fé depende apenas de cada um e a forma como a sentimos e exteriorizamos não implica que tenha de ser através de convenções de séculos, mas de acordo com a nossa própria consciência, sejamos católicos, ateus ou de qualquer outra religião.
Como diz Maria Madalena, a Fé parte do intelecto e não das ideias pré concebidas, trata-se pois de um filme onde cada um pode encontrar uma história diferente, desde que esteja aberto a ouvir os outros e a acreditar que cada dogma pode ser modificado pela consciência.
Ao contrário do filme de Scorcese ou do Código Da Vinci (não sei até que ponto Ron Howard será corajoso), este filme não gerou grande polémica dada a sua estreia reduzida e pouco comercial, a igreja também precisa dos holofotes para contrapor a sua critica... vejam este filme e depois critiquem ou concordem, mas não fiquem indiferentes.
Carpe Diem.
O primeiro filme que vi nesta 3.ª Edição do Indie.
Gostei imenso!
Estava a ver que este não tinha direito a "critica"... já me ia chatear consigo "Ó MEU GRANDE ARTISTA";)
Posted by Anónimo | 8:18 da tarde
Gostei muito do filme, porque nos deixa a pensar até que ponto somos ou não capazes de nos “agarrar” à fé (sem importar como), quando algo de mau nos entra pela vida dentro…
Bjs
Cláudia
Posted by Anónimo | 12:16 da tarde